
Por Adriano Fernandes
O atacante uruguayo Luiz Suarez tinha um problema. Era o último minuto da prorrogação e a Jabulani voava devagar, em direção à rede desguarnecida de goleiro, impossível de ser alcançada por qualquer parte do corpo cujo contato com a bola regra permitia. Suarez tinha ficado ali, em cima da linha da própria trave, e num golpe de sorte salvara o gol ganês com um dos joelhos. O atacante adversário insistira, de cabeça, e lá vinha a bola novamente, sua trajetória errática tendo já vencido o goleiro e um zagueiro: o último obstáculo era Suarez, o bom Suarez, que já tinha botado o Uruguay nas quartas-de-final com um gol de chapa contra a Coreia.
O metro e oitenta de Suarez jamais alcançaria aquela bola, a não ser que... como um goleiro, ou antes, como um gato, o atacante deu uma patada na bola, afugentando-a do destino iminente, a morte na rede. Com a mão. Com as duas mãos. Las manos de Dios. O gesto heróico, nobre, honesto, desesperado, irresponsável tirou Suarez de campo (a regra é clara: mão na bola pra evitar gol é cartão vermelho), mas botou a Celeste Olímpica no panteão mundial de onde ela nunca deveria ter saído. A caminho do vestiário, arrasado, Suarez viu Asamoah Gyan, o herói-vilão ganês, bater na trave o pênalti que ele, Suarez, trocou pelo gol óbvio. E a mão na bola desesperada fez todo o sentido: na decisão de pênaltis, o Uruguay venceu e avançou. Suarez se imortalizou como o protagonista de um dos momentos mais impressionantes da história das Copas.
O que faz o futebol ser o que é, é a entrega dos jogadores pela vitória. Em nome da vitória vale tudo: gol de canela, de virilha, de bico, sem-querer, impedido, de mão. A perseguição pela vitória não deve estar subordinada às 17 regras que regem o futebol, tampouco a um senso de beleza subjetivo. Não existe gol feio, feio é não fazer gol, diria o sábio. Também não existe defesa desonesta, desonesto é ver a bola entrar e não fazer nada, não meter a mão, mesmo sabendo que seu time estará fora. Se o juiz não perceber, melhor. Se ele perceber, paciência, seja expulso, mas dê uma chance a mais para o seu goleiro, para a trave, para o céu, para o Sobrenatural de Almeida. Suarez se sacrificou pelo time, e deu certo. Se não desse, não poderiam tê-lo acusado de falta de amor à equipe.
Futebol não é justo. Ele começa justo, mas a tendência é que o placar marque uma injustiça. O único resultado justo é o empate. Se fosse pra buscar a justiça, uma partida de futebol não deveria nem começar. A única ética que os jogadores devem respeitar é não quebrar a perna do adversário, nem ser racista. Fair play é uma invenção em que apenas o juiz deve acreditar. Se um jogador puder ganhar um lateral no grito, ele deve fazê-lo. Se puder cavar uma falta, idem. Se puder fingir que foi atingido e isso provocar um cartão pro adversário, faz parte do jogo. A única honestidade que se espera de um jogador é a luta pela vitória. O responsável por dar as mesmas condições de luta aos dois times é o juiz, mas é dever dos jogadores, trazer o juiz para o seu lado.
Só digo tudo isso porque me incomoda muito algumas pessoas quererem transformar o futebol num espetáculo mauricinho, cheio de ética, justiça, obediência e sem erros de arbitragem. Tudo isso faz parte do futebol e todo mundo que é torcedor de verdade sabe que essas são regras informais: a gente sabe que pode perder por um gol roubado, e sempre fica querendo que, da próxima vez, o juiz roube pro nosso lado. A bola pune. A bola puniu a França depois do gol de mão de Thierry Henry. Os deuses do futebol puniram a Inglaterra 44 anos depois de terem lhe dado de presente uma Copa do Mundo com um gol que não entrou (e em 2010, o gol que entrou por muito não foi marcado, contra a mesma Alemanha da final de 1966). Talvez a punição do Uruguay já esteja marcada. Mas Suarez desafiou os deuses, se eternizou. E faria tudo de novo.
O metro e oitenta de Suarez jamais alcançaria aquela bola, a não ser que... como um goleiro, ou antes, como um gato, o atacante deu uma patada na bola, afugentando-a do destino iminente, a morte na rede. Com a mão. Com as duas mãos. Las manos de Dios. O gesto heróico, nobre, honesto, desesperado, irresponsável tirou Suarez de campo (a regra é clara: mão na bola pra evitar gol é cartão vermelho), mas botou a Celeste Olímpica no panteão mundial de onde ela nunca deveria ter saído. A caminho do vestiário, arrasado, Suarez viu Asamoah Gyan, o herói-vilão ganês, bater na trave o pênalti que ele, Suarez, trocou pelo gol óbvio. E a mão na bola desesperada fez todo o sentido: na decisão de pênaltis, o Uruguay venceu e avançou. Suarez se imortalizou como o protagonista de um dos momentos mais impressionantes da história das Copas.
O que faz o futebol ser o que é, é a entrega dos jogadores pela vitória. Em nome da vitória vale tudo: gol de canela, de virilha, de bico, sem-querer, impedido, de mão. A perseguição pela vitória não deve estar subordinada às 17 regras que regem o futebol, tampouco a um senso de beleza subjetivo. Não existe gol feio, feio é não fazer gol, diria o sábio. Também não existe defesa desonesta, desonesto é ver a bola entrar e não fazer nada, não meter a mão, mesmo sabendo que seu time estará fora. Se o juiz não perceber, melhor. Se ele perceber, paciência, seja expulso, mas dê uma chance a mais para o seu goleiro, para a trave, para o céu, para o Sobrenatural de Almeida. Suarez se sacrificou pelo time, e deu certo. Se não desse, não poderiam tê-lo acusado de falta de amor à equipe.
Futebol não é justo. Ele começa justo, mas a tendência é que o placar marque uma injustiça. O único resultado justo é o empate. Se fosse pra buscar a justiça, uma partida de futebol não deveria nem começar. A única ética que os jogadores devem respeitar é não quebrar a perna do adversário, nem ser racista. Fair play é uma invenção em que apenas o juiz deve acreditar. Se um jogador puder ganhar um lateral no grito, ele deve fazê-lo. Se puder cavar uma falta, idem. Se puder fingir que foi atingido e isso provocar um cartão pro adversário, faz parte do jogo. A única honestidade que se espera de um jogador é a luta pela vitória. O responsável por dar as mesmas condições de luta aos dois times é o juiz, mas é dever dos jogadores, trazer o juiz para o seu lado.
Só digo tudo isso porque me incomoda muito algumas pessoas quererem transformar o futebol num espetáculo mauricinho, cheio de ética, justiça, obediência e sem erros de arbitragem. Tudo isso faz parte do futebol e todo mundo que é torcedor de verdade sabe que essas são regras informais: a gente sabe que pode perder por um gol roubado, e sempre fica querendo que, da próxima vez, o juiz roube pro nosso lado. A bola pune. A bola puniu a França depois do gol de mão de Thierry Henry. Os deuses do futebol puniram a Inglaterra 44 anos depois de terem lhe dado de presente uma Copa do Mundo com um gol que não entrou (e em 2010, o gol que entrou por muito não foi marcado, contra a mesma Alemanha da final de 1966). Talvez a punição do Uruguay já esteja marcada. Mas Suarez desafiou os deuses, se eternizou. E faria tudo de novo.
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