Coletivos Vazios


Por Sávio Oliveira


“Lá vem meu ônibus!” Despediu-se e correu. Enquanto corria ao encontro do coletivo, notara que a frase dita há pouco denotava certo sentimento de pertença. E não era mentira. Sentia que aquele ônibus era mesmo seu, que era parte da sua vida. Aliás, depois do dia estafante, o transporte remetia ao aconchego de casa. O ônibus que utilizava pra chegar à casa do avô também trazia consigo a lembrança do velhinho. Já os ônibus que iam a lugares desconhecidos, estes não geravam imagem nenhuma.
Assim que subiu, deparou-se com o esperado naquele horário. Um ônibus amontoado de corpos exaustos. Apenas corpos, pois suas almas vagavam bem longe dali, em devaneios. Corpos abarrotados e de almas tão distantes.
Olhares tristes e sonolentos percorriam o exterior da janela à procura de algo interessante. Olhares que até se cruzavam às vezes, porém, dificilmente se reconheciam. Nem chegaram a ver o vendedor de bombons que discursava lá dentro, e parecia emitir uma voz automatizada em ritmo mecânico. Após o vendedor descer, o silêncio predominou novamente e era ameaçado apenas por ruídos do desgastado motor. O choro de um bebê tentou interromper, mas foi rapidamente abafado pela mãe que desejava evitar olhares ríspidos.
Tantos corpos pendurados, balançando em cada curva faziam do ônibus um caminhão frigorífico transportando carnes ao açougue. Carne abatida. E os que ainda não estivessem abatidos, serão em seus lares pelo cansaço, pela tevê ou por outro motivo qualquer.
É incrível como um veículo coletivo pode ser tão individual, cada corpo com seu fone de ouvido, vivendo em seu próprio mundo. Vidas distintas com destinos distintos. Mas que possuíam algo em comum: estavam reunidos ali por algum propósito, e naquele ônibus aqueles corpos se aproximavam, se encostavam, porém dificilmente se falavam. Talvez receio de estranhos.

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